Correios do outro mundo

        Aparentemente era mais um final de tarde, fim de um dia de trabalho naquela agência dos Correios.  

O sol brilhava, e daquele brilho, enquanto as pessoas saíam do trabalho,  outra movimentação ocupando o mesmo espaço começava a surgir.

Mas não parecia estar na mesma dimensão de espaço..



                        Correios do outro mundo

                        Por:  Roberto Zaghini



Aqueles que saíam deparavam-se com os que iam entrando, mas não notavam. Tudo muito claro como o brilho do sol, entrelaçando presenças.

Balcão de atendimento, cadeiras de espera mudaram um pouco de formato, mantendo a mesma função.

Um homem transparente e luminoso tomou lugar próximo ao balcão, e assentado, chamou o primeiro que aguardava atendimento.

Era uma senhora, de silhueta fina, com ar pouco entristecido.

- Pois então senhora, em que podemos ajudá-la ?

- Estou ainda muito triste, pensei que se fosse possível enviar algumas mensagens a certas pessoas que estiveram comigo, talvez pudesse aliviar meus sentimentos.

Nesse instante o homem luminoso fez um sinal com a mão e o braço erguido, indicando elevação, e outro colaborador também transparente, de cor pouco mais escura, tomou lugar logo mais atrás de onde seria um balcão, na direção à esquerda do atendimento.

Começou então a tocar uma canção suave, em coral, que trazia tranquilidade ao ambiente.

-Diga senhora, o que a incomoda nesse instante?

- Pessoas com quem convivi em família e até colegas de trabalho que não tive tempo de me despedir, foi tudo muito rápido. Um deles em especial. Havia sido cruel em outra existência e na passagem que ainda vive, precisava ser tratado da mesma forma, por desejo seu, uma imposição.

- Não faz ideia o quanto isso me doía ao coração, eu nem suportava mais tratá-lo com crueldade. Tentei várias vezes deixar esse papel, mas ele parecia irredutível.

 Sabia que a existência terrena não me pertencia em todo, mas somente em alguma parte. Mas não tinha como saber que teria de partir..  e ainda hoje aquelas cenas me vêem à alma e incomodam causando dor..

- Entendo perfeitamente, creio que a melhor solução seria uma mensagem dinâmica. O que a senhora acha?

- Estaria muito bom, se fosse possível.

-Concentremos então..

Repetiu nesse momento com o braço voltado para trás o gesto que já havia feito e o atendente que acionava a canção, aumentou um pouco o volume.

Dava pra notar que estava emocionado com olhos marejados.. enquanto manipulava algo de onde saía o som.

O senhor luminoso e a senhora colocaram as mãos sobre a testa encobrindo o semblante, e se concentraram por alguns instantes. Até que interromperam. E o homem luminoso indagou:

- Então a mensagem está pronta?

- Está sim, creio que esta será ideal.

Colocando a mão dentro de seu peito esquerdo, retirou um pequeno objeto que pulsava e brilhava ao mesmo tempo, em formato de caixinha.

- Que linda mensagem, acho que vai dar certo, vamos entregá-la diretamente.

Impressionante ou simplesmente natural para quem vive aquelas coisas. Se entendi bem, aquela caixinha poderia se comparar a um pen-drive, e seria enviada para fazer parte de uma dessas noites de sonho daquela pessoa citada.

Era esse o serviço que seria prestado naquela situação pelos Correios, do outro mundo.

Satisfeita com o atendimento a senhora parte em direção à luminosidade mais intensa que aguardava na saída daquela agência..

- O próximo..

Um homem aparentando idade avançada, diria que quase 70 anos, chega bem próximo, senta-se e começa a falar.

- Contribuí tantos anos de minha vida terrena nos Correios e não consigo aceitar que agora não sirvo mais, que não posso voltar a trabalhar no lugar que representa tudo pra mim. Quero poder voltar ao meu serviço.

- Você sabe muito bem que sua experiência naquela escola já passou. Deveria inclusive ter apreendido a lição maior do por que esteve  lá.  E por que acha que deve permanecer com essa mesma aparência terrena, se hoje teve a graça do transporte de plano?  Deveria vivenciar esta fase muito importante de sua vida. O amor o trouxe de volta, agora este é o seu lugar. 
Não tem mais nada a fazer naquele correio terreno.
Lá, com sua imagem, ainda que oculta, você só iria causar danos. Tenho certeza que não é isso que você quer.

- Jamais, eu só pretendia continuar lá.




- Mas não pode, não deve. E para que sinta de vez que foi o amor que o trouxe de volta, quero que venha fazer parte de nossa equipe, neste Correio.

Um sorriso foi se esboçando no semblante daquele homem. Seu corpo foi se iluminando, sua aparência rejuvenescendo, e já feito luz levantou-se.

O atendente chefe ergueu mais uma vez sua mão com o braço para trás, indicando sinal de elevação.  O auxiliar logo fez surgir aquela música vocalizada, em coral.  O homem já mais jovem e iluminado adentrou o espaço daquele Correio, para se juntar à sua nova equipe, seu novo trabalho.

Nesse instante mais alguém entra no salão de espera. Aproxima-se do atendente sem esperar que o chamem.

- Então ele aceitou, finalmente!

- Entendeu de vez sua nova condição, parece estar feliz agora. Espero que venha contribuir com nosso trabalho.

- Muito bom, fico mais aliviado agora. Mas realmente não estou tão feliz assim, pois enquanto estive por lá em nosso Correio, tentando traze-lo de volta, senti de perto o momento que atravessam.
De um lado a ganância terrena que a tudo consome pretendendo predominar.  De outro a incompreensão, que vem prejudicando a evolução desta escola.

- Sei do que está falando, mas todos que vivem este momento, já sabiam antes de reencarnar, o que lhes aguardava, o que teriam que passar. Escolheram viver estas coisas.

- Nem por isso deixam de sofrer e de causar sofrimentos.

- Verdade, mas creio  que possamos auxiliá-los. 

- Acho que é o momento, é sempre preciso e importante a participação. Vamos enviar nossa mensagem.

Mais uma vez o atendente ergue sua mão, desta vez com os dois braços  adiante de sua imagem, quase transparente. 

Diante desse gesto, um som com instrumentos de sopro que nem sei como descrever, lançou no ar uma sonoridade de paz, de entusiasmo.

Ambos colocaram então a mão direita sobre a testa, baixando levemente a cabeça como se estivessem concentrados, pensando.

Logo atrás toda numerosa equipe daquele lugar, se junta. Uma luz intensa toma conta de tudo. 

Pude sentir um calor no peito, promovendo uma agradável sensação de amor.

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