Serra do Mar: visitando o último morador da zona sul com Caminhos e Trilhas!

        Final de tarde retornando do trabalho, a multidão caminhando rumo ao buraco da linha amarela. 

Sempre tem alguém fazendo uma foto, um vídeo, mas é assim mesmo, uma multidão um no calcanhar do outro, parece que numa grande cidade como São Paulo o melhor jeito de aperfeiçoar o ir e vir, é pelos buracos na cidade.

Pensei nisso quando lembrei da explicação do nosso colega ciclista, que conduzia o pedal até a Serra do Mar:

- Aqui como vocês podem ver já bem coberto por vegetação era um dos buracos, onde até 1927 queimavam lenha pra fazer carvão, que alimentava a indústria da época...  nesta área haviam estradas para conduzir essa produção...

                    Visita ao último morador da zona sul
                    com o grupo Caminhos e Trilhas e Pedala Parelheiros:
                     Por: Roberto Zaghini


Começamos com um encontro numa manhã de domingo, num dos pontos marcados, antes das sete horas próximo ao terminal Grajaú. 

Cumprimentos, abraços, e assim que todos se encontraram, bora pro pedal, Elisângela conduzindo o primeiro pelotão de ciclistas, foi direcionando por dentro dos bairros até atingir a avenida Teotônio Vilela, próximo do terminal Varginha.

Subidas eram os primeiros cartões de  visita, deste trajeto, até então no asfalto.  

Mais adiante, uma parada combinada num posto de combustível, onde encontramos mais um pessoal.

Alguns partiram na frente, outros ficaram aguardando, por que em Parelheiros, havia mais um ponto de encontro, bem na frente da igreja.

Contei com apoio do colega Vitor e seu Heitor, fomos em três largados do primeiro grupo em direção ao Parelheiros, até porque geralmente pedalo pouco mais lento então pra adiantar... 

Ali formando um grupo de sei lá mais ou menos uns trinta ciclistas... mas era assim se juntavam num trecho, se distribuíam em outros, e fomos avançando.

O grupo tomou o rumo do Colonia, à esquerda do centro de Parelheiros. Fomos pra direção de Evangelista de Souza.

A manhã estava muito agradável, com sol ainda suave, horário avançando e o pedal também.  

Nessas alturas, já contávamos com a participação do ciclista Fernando, que também faz parte da APA Capivari Monos, e que conhece muito bem aquela região.

Sei dizer que quando chegamos próximo a um lugar chamado creio que Poço das Virgens, atingimos uma área de onde só se avança à pé ou de bicicleta, com trilhas estreitas, terra, lama, muitas folhas e chão escorregadio.

Todos muito animados pra avançar, comentavam durante a semana sobre essa ciclo aventura.

Talvez por isso nem sentiram a primeira parte, porque pra avançar até o Parelheiros tem várias montanhas, um sobe e desce só. Exigindo muito empenho do ciclista, e atenção, porque também tem muita fluência de trânsito motorizado, carros e ônibus.

A manhã ajudava o sol fazia o dia mais alegre e o entusiasmo de cada um animava, então chegamos ao início do trecho de trilhas. 

Essa é uma grande diferença: No asfalto o chão rende mais, o pedal avança quilômetros já nas trilhas o cuidado é maior, ainda mais com muitos, como eu que nem são acostumados a esse tipo de trajeto. Meu primeiro objetivo era não cair...

Fernando e a Elisângela, a Val e tantos outros já estavam mais acostumados, o Rodrigo, Pulmão também não estranhava, havia um misto de ciclistas com e sem o conhecimento de pedalar em trilha.

Num certo momento valeu muito o toque do Jhony:

- Aqui pra subir bem é melhor baixar a marcha no mais leve possível, aí você pedala suave e avança melhor...

Não deu outra, eu nunca tinha acionado a marcha mais baixa da minha bike, mas ele tinha razão, deu certo...

E esses toques foram muito importantes, a mata ia engolindo todos ciclistas, abraçando a nós todos, o vento sumiu, e veio o frescor das árvores, das correntes de água que íamos encontrando, muito verde um ar e paisagem que todos somos carentes de encontrar.

Com isso o cansaço nem incomodava. O lance era avançar. 

E por volta de meio dia, depois de passar sobre troncos de árvores, feito pinguelas sobre corredeiras de água, e até tábuas chegamos à área onde vive o último morador da zona sul, o Odileu.

Uma festa só, cada um e todos estavam em festa pelo feito. E os bate papos e a curiosidade sobre o ilustre morador começavam a surgir.  

A Elisângela tratou de atear o fogo na lenha, e já colocou um panelão ali pra preparar um arroz. O prato do dia estava combinado, seria arroz, feijão, Tilápia da criação da casa. E uma mistura à base de couve que traria maior energia.

Mas a curiosidade era em torno de Odileu, queríamos ouvir o que ele tinha a dizer...

- Minha formação é de mecânico, já tive oficina, até largar tudo e vir pra cá...

- O pessoal fala .. você já tomou vacina contra febre amarela? pois eu não tomo, não preciso disso, quer dizer então que o humano é santinho nessa história?  ele não causou nada...  Olha isso aqui, não tem nada aqui que prejudique ninguém, os bichos não fazem mal nenhum...

Ele é bem ligado nisso, e despertou alguma coisa na mente das pessoas. Quem vive numa cidade grande perde muito da natureza. E era fantástico ouvir a versão do Odileu.  Um homem magro de meia altura que conserva uma barba no queixo, lembra o Raul Seixas, sem bigode... 


- Por aqui passa onça também às vezes chega aqui bem perto..

- Espera aí, ela não te ataca?

- Não ela passa por aqui, porque é o lugar dela, tem a onça parda e outros tipos de animais, quer ver as pegadas, olha aqui...

Mostrou com a mão na terra, sobre uma pegada que seria de uma anta. 

- Tá vendo? essa é das grandes!

Praticamente à porta de onde ele fica. Quer dizer de um dos lugares. A cozinha e um quarto ficam no local mais alto, mas devido a uma intrusa Odileu também teve que fazer mais um quarto mais abaixo, próximo dos lagos que construiu e onde cria tilápias.

A tal da Lontra.

- Essa danada chega de noite, e vai direto para os lagos, ela pega a tilápia, come e a parte que não interessa larga no chão, e volta pro lago... se eu não espantar acaba com minha criação...

Parecia engraçado pra gente ouvir isso, mas ele realmente tem de levar à sério, é um concorrente importante e potencial a suas pretensões de sobrevivência.

Tem de criar tilápias, produzir mel, pra faturar alguma coisa na cidade de vez em quando.   Nesta visita, cada um que optou pelo prato de tilápia, pagou 15 reais.

Odileu também contou que às vezes quando vai à cidade e volta muito tarde, já de noite, tem de gritar durante o trajeto, para espantar onças, e não ter uma surpresa no caminho.

Esses trechos de conversas aconteceram na hora do rango. Uma garoa fina caía nesse momento, mas nosso cicerone, o Fernando disse que é assim mesmo, sempre cai uma garoa e depois volta o sol. Isso deixaria nosso retorno pelas trilhas ainda mais emocionante.

 Mas antes do almoço, pouco depois de chegar, uma turma foi até a área da corredeira de águas cristalinas, passando por uma trilha à pé, avistando uma cachoeira.

Incrível ver água tão cristalina assim em São Paulo!!

Um pouco adiante da corredeira de água, forma-se uma piscina natural, onde os ciclistas arriscaram um mergulho. 

Água fria, muito gostosa, que maravilha refrescante, depois de tanto pedalar.

Fizeram fotos de tudo quanto foi jeito, na cachoeira, nas trilhas, na piscina natural... 

Num trecho dessa trilha feita à pé, o Fernando que também participa da APA (Associação de Proteção Ambiental) Capivari Monos mostrou que por traz de umas folhagens havia um buraco, dava pra notar, e ali até 1927 queimavam lenha pra produzir carvão e servir à indústria da época. 

Havia inclusive estradas que ligavam à cidade para transportar esse carvão. Mas felizmente essa trajetória foi interrompida, e o local passou a ser preservado, a floresta reapareceu e cobriu tudo.

Ficou aqueles buracos já bem cobertos por folhagens.

Na volta percorrendo a trilha à pé depois da passagem pela piscina natural, ouvi um aviso que me soou estranho, o Paulo Gomes, Paulão:

- Tenta curvar mais pra caminhar aqui, se você continuar andando em pé vai ficar mais difícil pode até cair. Tente caminhar como macaco, curvado...

Eu tentei, acho que deu certo, não caí...

O almoço transcorreu no maior bate papo, com vista privilegiada para imensidão do verde.

Quem não tinha ido até a cachoeira aproveitou o momento do almoço pra ir.  

Uma parte do grupo voltou antes, nem ficou pro almoço.

Iracema uma das ciclistas, ainda conseguiu negociar com Odileu um favo de mel. Muitos trouxeram limão que tem um sabor mais natural bem diferente, uma delícia. 

Por volta das três da tarde, despedimos do nosso amigo, que só apareceu numa única foto que eu vi.

A volta, exigiu mais ainda de todos, a trilha era mais difícil, e ainda optamos por seguir na linha do trem que parte da Serra do Mar, um longo trecho de pedras onde nem dá pra pedalar, tínhamos que empurrar a bike, bem ao lado da enorme composição.

Aí a bike do Marcos apresentou um problema: quebrou o parafuso que sustentava o banco.  A solução foi retirar o canote.

Surgiu então um "herói" o Rodrigo Pulmão, se prontificou a emprestar a sua ao Marcos, já de meia idade, e ficou ele com sua juventude com a bike sem banco, pedalando o tempo todo em pé!  Haja disposição, esse garoto tem fôlego, poderia até se inscrever pra participar de provas..

Passávamos empurrando as bikes ao lado da enorme composição, e..ouvimos um ruído de energia elétrica chegando nas rodas das composições, e o Fernando já avisava: quando vem esse barulho é porque o trem vai partir.

E em poucos instantes a enorme composição começou a se mover. bem ao nosso lado.

Elisângela ainda arriscou: Deve estar carregado de milho.

Éramos tão pequenos diante daquela grandeza ruidosa, caminhando sobre as pedras ao lado dos trilhos empurrando as bikes. 

Chegamos à uma vila onde praticamente só existe uma moradora, e alguns foram pedir água.   

A velha senhora até arranjou para um dois, três, quatro.. aí ela se encheu, e fechou a porta.  Pra nós era festa, sem problemas...

Tiramos mais fotos ainda, cada trecho era registrado.

Chegamos até uma trilha onde boa parte teve que empurrar a bike, pois além de muito estreita, tinha buracos com lama e era certo de cair, com a freada brusca no atoleiro...

Depois de muito transitar por lugares onde se avança bem lentamente, chegamos ao asfalto e voltando da ciclo viagem, passamos pelo Colônia, que bairro agradável, sensação de estar no interior e não na capital. 

Nosso amigo Fernando ficou em sua morada, e seguimos viagem de volta rumo ao Parelheiros, já noite feita, avançamos por entre carros com trânsito já bem intenso.

Disputando espaço entre os veículos motorizados, com alguns impacientes, e a maioria nem nos vendo, e nem se importando com nosso deslocamento.

Pensei nisso também quando estava entre aquela multidão rumo ao buraco da linha amarela. 

Lá em 1927 quando queimavam lenha pra fazer carvão, um dia desistiram daqueles buracos, e resolveram preservar a região.

Mas aqui, no centro da maior cidade, da megalópole São Paulo esses buracos se tornaram maiores, e imprescindíveis pra se deslocar. 

De certa forma queria lembrar daquele trecho rumo à piscina natural, enquanto estava ali, entre aquela multidão.

Realmente somos muito carentes de natureza, não há concreto que nos faça esquecer da origem. Onde tudo começou.


Participaram deste pedal: Elisângela, Fernando bike, Gustavo, Alex - Pedala São Norberto, Nill, Jhony, Matheus, Bahia, Rodrigo Ferreira, Luizinho, Ho, Lucas Dias, Iracema, amigo de Iracema, Celso, Vanderlei, Joel, Paulo Gomes, Roberto, Amor Bike (Arnon), Denis J.Miriam, Val Andrade, Adriano, Palhinha, Marcão, Sandy bike, Alexandre Silveira, Pedro Feitosa, Jorge.

Parabéns a todos!


Lontra, a "grande" concorrente do nosso amigo Odileu:









https://www.youtube.com/watch?v=ab1YY1vvbQ8&feature=youtu.be

Trilha pra Cachoeira do Parque Serra do Mar


https://www.youtube.com/watch?v=vgZxK6YRvT8&feature=youtu.be

Piscina natural 





https://www.youtube.com/watch?v=acnJevwSXAM&feature=youtu.be
Na morada do Odileu, último morador da zona sul de SP.


































































À esquerda Odileu e à direita Fernando









     
   

https://www.youtube.com/watch?v=sR3KsVzZmn4&feature=youtu.be

(Trem passando ao lado das bikes...)










Comentários

  1. Que show amigo adorei o blogge sucesso pra ti, esse dia vai ser inesquecível encantada com as aguas cristalinas e todo o resto paisagem belíssima bjos.

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